quarta-feira, novembro 02, 2005

Quero Escrever o Borrão Vermelho de Sangue

Quero escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando
de dentro para dentro.
Quero escrever amarelo-ouro
com raios de translucidez.
Que não me entendam
pouco-se-me-dá.
Nada tenho a perder.
Jogo tudo na violência
que sempre me povoou,
o grito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu,
por falso respeito humano,
não dei.

Mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
Quero abarcar o mundo
com o terremoto causado pelo grito.
O clímax de minha vida será a morte.

Quero escrever noções
sem o uso abusivo da palavra.
Só me resta ficar nua:
nada tenho mais a perder.

Clarice Lispector

1 comentário:

Anónimo disse...

Aeval,o poema da Clarice é uma escolha tua,maravilhosa,pois isso diz muito a qualquer mulher!
Para te oferecer tenho hoje um soneto, um beijo--- HIP

Sinto-me vazio,quase não sou nada..
Fiquei sem forças,como me lamento!
Parece que dei em falso uma passada
Dói-me a alma..nem gritar já tento!

Por cima tenho o céu,infinda pista,
À minha volta,lágrimas,um mar!...
Sou uma ilha nua sem terra à vista,
Se dou um passo é para tropeçar!

Remos,ancora e barca eu já tive,
Mas tudo perdi,desfez-se em nada,
Não sei onde está ou se ainda vive.

Com ela cruzei mares,vi castelos...
Era minha luz,por mim muito amada,
Para agora ficar,só com sonhos belos HIP