sexta-feira, julho 05, 2013

Não te amo mais!

Lonesome Road - Harry Glaser
Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...


Clarice Lispector

sexta-feira, outubro 12, 2012

Daily Life 3rd prize


You came to me this morning
And you handled me like meat
You’d have to be a man to know
How good that feels, how sweet

My mirror twin, my next of kin
I'd know you in my sleep
And who but you would take me in
A thousand kisses deep

I loved you when you opened
Like a lily to the heat
You see I’m just another snowman
Standing in the rain and sleet

Who loved you with his frozen love
His secondhand physique
With all he is and all he was
A thousand kisses deep

I know you had to lie to me
I know you had to cheat
To pose all hot and high
Behind the veils of sheer deceit

Our perfect porn aristocrat
So elegant and cheap
I’m old but I’m still into that
A thousand kisses deep

I’m good at love, I’m good at hate
It’s in between I freeze
Been working out but it’s too late(It’s been too late for years)
But you look good, you really do

They love you on the street
If you were here I’d kneel for you
A thousand kisses deep

The autumn moved across your skin
Got something in my eye
A light that doesn’t need to live
And doesn’t need to die

A riddle in the book of love
Obscure and obsolete
And witnessed here in time and blood
A thousand kisses deep

But I’m still working with the wine
Still dancing cheek to cheek
The band is playing Auld Lang Syne
But the heart will not retreat

I ran with Diz, I sang with Ray
I never had their sweet
But once or twice they let me play
A thousand kisses deep

I loved you when you opened
Like a lily to the heat
You see I’m just another snowman
Standing in the rain and sleet

Who loved you with his frozen love
His secondhand physique
With all he is and all he was
A thousand kisses deep

But you don’t need to hear me now
And every word I speak
It counts against me anyhow
A thousand kisses deep

Leonard Cohen

domingo, janeiro 08, 2012

Loucos e Santos




Escolho os meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero o meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e aguentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho os meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Os meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade a sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

quinta-feira, janeiro 05, 2012

Crise lamentável



Gostava tanto de mexer na vida,
De ser quem sou – mas de poder tocar-lhe...
E não há forma: cada vez perdida
Mais a destreza de saber pegar-lhe.

Viver em casa como toda a gente
Não ter juízo nos meus livros – mas
Chegar ao fim do mês sempre com as
Despesas pagas religiosamente.

Não ter receio de seguir pequenas
E convidá-las para me pôr nelas –
À minha Torre ebúrnea abrir janelas,
Numa palavra, e não fazer mais cenas.

Ter força um dia pra quebrar as roscas
Desta engrenagem que emperrando vai.
– Não mandar telegramas ao meu Pai,
– Não andar por Paris, como ando, às moscas.

Levantar-me e sair – não precisar
De hora e meia antes de vir p'rà rua.
– Pôr termo a isto de viver na lua,
– Perder a frousse das correntes de ar.

Não estar sempre a bulir, a quebrar coisas
Por casa dos amigos que frequento –
Não me embrenhar por histórias duvidosas
Que em fantasia apenas argumento

Que tudo em mim é fantasia alada,
Um crime ou bem que nunca se comete:
E sempre o Oiro em chumbo se derrete
Por meu Azar ou minha Zoina suada...


Mário de Sá-Carneiro

quinta-feira, outubro 13, 2011

A partida



Ordenei que tirassem o meu cavalo da estrebaria. O criado não me entendeu.
Fui pessoalmente à estrebaria, selei o cavalo e montei-o.
Ouvi soar à distância uma trompa, perguntei-lhe o que aquilo significava. Ele não sabia de nada e não havia escutado nada.
Perto do portão ele me deteve e perguntou:
– Para onde cavalga senhor?
– Não sei direito – eu disse –, só sei que é para fora daqui, fora daqui. Fora daqui sem parar; só assim posso alcançar meu objetivo.
– Conhece então o seu objetivo? – perguntou ele.
– Sim – respondi – Eu já disse: “fora-daqui”, é esse o meu objetivo.
– O senhor não leva provisões – disse ele.
– Não preciso de nenhuma – disse eu. – A viagem é tão longa que tenho de morrer de fome se não receber nada no caminho. Nenhuma provisão pode me salvar. Por sorte esta viagem é realmente imensa.

Franz Kafka